Biografia
Daniel Augusto da Cunha Faria nasceu
em Baltar no dia 10 de abril de 1971. Licenciou-se em Teologia, na Universidade
Católica e em Estudos Portugueses, na Faculdade de Letras da Universidade do
Porto.
No decorrer dos estudos universitários
Daniel Faria concorreu a vários prémios literários, publicou os primeiros
poemas e organizou um Círculo de Leitura(s) com o objetivo de promover a
escrita poética e o contacto com autores; colaborou em diferentes revistas e
fez desenhos, colagens, mobiles, encadernação e encenações.
A par da vida académica Daniel Faria
desenvolveu um trabalho de serviço à comunidade, nomeadamente no Marquês e no
Marco de Canaveses.
Aqueles que privaram com o poeta
descreveram-no como fiel aos seus valores, um aluno aplicado e um amigo leal.
Acerca de si próprio escreveu que era «um rosto que há-de vir» (Público, julho 14, 2001).
Após os estudos Daniel Faria optou pela
vida monástica no mosteiro beneditino de Singeverga. No seguimento de uma queda
doméstica faleceu no dia 9 de junho de 1999.
O jovem poeta publicou em vida várias
obras: Uma Cidade com Muralha (1991),
A Casa dos Ceifeiros (1993), Explicação das Árvores e dos Outros Animais
(1998) e Homens Que São Lugares Mal
Situados (1998), aos quais se seguiram, de publicação póstuma, Legenda para uma Casa Habitada e Dos Líquidos, ambos no ano 2000.
Considerado por alguns como um Poeta
Maior da Língua Portuguesa, bebe as suas referências em alguns poetas
portugueses como Herberto Helder, Sophia e Eugénio de Andrade.
Sophia foi para Daniel Faria o princípio
da poesia e quando chegou a vez de Sophia o ler disse: «versos que põem o
mistério a ressoar em redor de nós» (Público,
julho 14, 2001).
Tolentino de Mendoça observou acerca da
poesia de Daniel Faria: «é uma das aventuras poéticas mais radicais e luminosas
que o século XX inscreveu na literatura portuguesa» (2012, Câmara Clara, RTP 2).
O poeta foi traduzido em várias línguas
e tem sido objeto de teses de doutoramento.
Poesia
I
Amo
o Caminho que Estendes
Amo
o caminho que estendes por dentro das minhas divisões.
Ignoro se um pássaro morto continua o seu voo
Se se recorda dos movimentos migratórios
E das estações.
Mas não me importo de adoecer no teu colo
De dormir ao relento entre as tuas mãos.
II
Diário
Seja
o que for
Será
bom
É
tudo.
III
Das
manhãs
Apenas
levarei tua voz
Despovoada
Sem
promessas
sem
barcos
E
sem casas
Não
levarei o orvalho das ameias
Não
levarei o pulso das ramadas
Da
tua voz
Levarei
os sítios das mimosas
Apenas
os sítios das mimosas
As
pedras
As
nuvens
O
teu canto
Levarei
manhãs
E
madrugadas
IV
Voz
no vento passando entre poeira
Edifício
Árvore
noutro poema
Fico
à sombra da vide e do esteio no outono
E
enxerto a luz
Em
tudo o que nomeio
V
Explicação
da Ausência
Desde que nos deixaste o tempo nunca mais se transformou
Não rodou mais para a festa não irrompeu
Em labareda ou nuvem no coração de ninguém.
A mudança fez-se vazio repetido
E o a vir a mesma afirmação da falta.
Depois o tempo nunca mais se abeirou da promessa
Nem se cumpriu
E a espera é não acontecer — fosse abertura —
E a saudade é tudo ser igual.
VI
Pórtico
Com os meus amigos aprendi que o que dói às aves
Não é o serem atingidas, mas que,
Uma vez atingidas,
O caçador não repare na sua queda.